Dudu 20 anos! (em 08/09/2018).
Existem pessoas que Deus coloca em nossas vidas para que da maneira mais inesperada tomemos consciência de coisas tão simples, que de tão simples, em nossa incapacidade de entendermos o que se passa ao nosso redor, acabam ficando muito distantes de nós.
Assim foi a entrada do meu filho Luiz Eduardo, o Dudu, em minha vida e que hoje está completando vinte anos de idade.
O dia do seu nascimento foi um dia difícil. Foi numa terça feira. Foi em um oito de setembro, aniversário da minha cidade natal, Vitória. Foi, portanto em um feriado.
A Jamille, minha esposa, sentiu as primeiras dores logo pela manhã, o que foi piorando ao longo do dia. Estávamos na casa de sua madrinha com seus primos pequenos, o Rodrigo e o Rafael, dos quais então eu tinha a honra e incumbência de ser o ”irmão mais velho honrário” e claro, o Lula, o cão de estimação da família. Sua madrinha estava em viagem pela Europa. O médico que fazia o acompanhamento obstétrico dela e dele, não estava na cidade. Havia viajado com a família por ocasião do feriado e eu não conseguia contatá-lo. Não era tão fácil assim achar alguém naquela época. Eram outros tempos tecnológicos.
As coisas não haviam sido planejadas assim. As coisas estavam fora do tempo. A gestação era de sete meses ainda. Claramente algo não ia bem.
Dada a rapidez do agravamento das dores da Jamille, que já sentia fortes contrações que encurtavam a cada quinze minutos, apesar das efusivas tentativas do bravo Lula, o cão da família, em consolar a Jamille (que impressionante a sensibilidade apurada dos animais não homo sapiens) não tive alternativa que não fosse conseguir estabelecer contato com nosso médico, o Dr.Adib, o que felizmente acabei conseguindo. Ele nos informou que estava retornando para Vitória e que deveríamos nos dirigir para a maternidade para que ela começasse a ser acompanhada e que ficássemos tranquilos (fácil falar!), mas assim fizemos.
Foi uma espera longa. É sempre desagradável ficar em salas de recepção de ambientes hospitalares. Enfim, a melhor memória dessa espera foi minha filha e meus primos que diante de uma maternidade vazia, com a maioria dos longos corredores apagados não perderam a oportunidade de realizar uma aventura que acabou quanto ao tentarem explorá-la, ao estilo Tomb Raiders, conseguiram tão somente disparar o alarme geral do prédio dando um baita susto geral e quebrando divertidamente a tensa monotonia da espera. A cara pálida deles no retorno da malfadada aventura jamais sairá da minha memória.
Chegando o Dr.Adib, Jamille foi imediatamente internada e levada para a sala de parto. Parto realizado. O bebê nasceu. Fui avisado que ele teria ido para UTI, pois havia nascido com certo grau de insuficiência respiratória, que mais tarde foi confirmada como sendo uma pneumonia. Foi outra coisa não esperada. Assim é o Dudu, cheio de surpresas!
Logo me permitiram entrar na UTI neonatal para vê-lo. A primeira impressão que eu tive é que ele estava meio inchadinho e roxinho demais. Respirava com dificuldade e com ajuda de oxigênio. Mas não me abalei, confesso, aliás, senti paz naquele momento.
Nessa UTI neonatal ele ficou por 21 longos dias. A partir daí a sua ficha medica foi alongando, alongando, a um ponto que não será proveitoso nesse momento de celebração da vida detalhá-la. Prefiro me ater ao resultado vitorioso da guerra do que à crueza dos combates. O que eu posso dizer a respeito para resumir é: que menino valente é o Dudu!
Superação. Essa é uma característica muito sua! O Dudu se tornou especialista em desbancar os prognósticos negativos dos médicos: Não ia sobreviver – Hoje completa seus20 anos! Ia ter problemas cognitivos sérios, só me faltou os médicos me dizerem que ele teria o QI de um vegetal – pois bem, a resposta ao prognóstico é: ele tem memória fotográfica: como é fácil saber de cor a programação de mais de 150 canais da TV acabo certo Dudu? É autista (?) – mas se relaciona plenamente com sua família e comunidade. Não iria falar – Hoje fala português, inglês e suspeitamos seriamente que entende bastante japonês. Não posso afirmar porque não falo o idioma. Não iria andar – andou. E assim foi. E assim ele vai.
Todos dizem que ele é o filho que fisicamente mais se parece comigo. De fato, somos parecidos sim. Mas ele e muito melhor do que eu. O que mais me impressiona no Dudu não são suas façanhas, sua insistência em provar o improvável. O que mais me impressiona no Dudu é a sua atitude diante da vida, apesar das limitações, que são bem reais.
Nesses 20 anos não me lembro de Dudu ter acordado um só dia que seja de mau humor ou emburrado, ou qualquer coisa que o valha. Nesses 20 anos nunca vi nada tirar o sorriso rasgado do seu rosto. Nenhuma! Nenhuma reclamação sequer. É a encarnação da alegria de estar vivo que só se encontra nos heróis, aqueles dos épicos, que endurecidos nos rigores do bom combate, sabem como poucos valorizar o valor de estar vivo.
A gratidão. Como todo herói, como todo sobrevivente de batalhas grandiosas, o Dudu é grato. Como o Dudu é grato nas mínimas coisas! “Obrigado pela cama”, “obrigado pela comida”, “Obrigado mãe, muito obrigado mãe”, ”muito obrigado ‘seu’ pai”, e por aí ele vai.
Quanta disciplina! Quanta organização!
E o bom-humor? Piadista, galhofeiro como ele só, aproveita todos os momentos, sobretudo os mais triviais para fazer uma brincadeirinha aqui outra ali, sendo a jamille, a mãe, a sua ‘vítima’ favorita. Isso é saber viver. Isso é o verdadeiro carpe diem.
Dudu é um exemplo para mim. Dudu me ensina e me mostra o caminho para ser a pessoa melhor que quero e devo ser. Dudu me envergonha quando muitas vezes me pego reclamando de trivialidades e olho para o lado e o vejo sempre alegre a bem disposto apesar de suas limitações, que para ele não passam de simples desafios em processo de conquista.
É Dudu, 20 anos não são 20 dias! Duas décadas nêgo! Quão agradecido e sou a Deus por ele ter te colocado na minha vida. Como passou rápido! Como valeu a pena cada noite de sono perdida velando o seu e depois ir trabalhar para poder manter o suporte material que você precisava para continuar lutando e vencendo as suas batalhas. Como valeu a pena a torcida e a certeza de que você ia seguir adiante e continuará seguindo, vencendo as dificuldades apesar de tantos prognósticos contrários. Valeu a pena Dudu! Você me ensina que viver vale a pena!
Obrigado por existir Dudu, nêgo do pai!
Ass. Seu pai.
(Crédito: Ilustração GIL)