O Alfarrabista

O Alfarrabista

Nós não vivemos no melhor dos mundos, por isso, é melhor nos acostumarmos com este aqui mesmo (em 19/04/2016).

image MUNDO

Esse texto era para ter sido escrito há algumas semanas atrás. Não consegui. O calor e a velocidade dos acontecimentos do país não me deixaram. Fui atropelado. Então me permito divagar.

O seu título pode parecer conformista. Não é. É realista. E, parece que realismo, é justamente o que tem faltado ao Brasil desde a sua “fundação” em todas as esferas da vida nacional. Começa em nós, indivíduos.

Nossos mitos fundadores: Pensamos que somos uma nação que não somos, que estamos em classes em que não estamos, simplesmente porque nos disseram. Somos levados a crer que a pertença a uma classe tem ligação direta com o nível de renda do indivíduo – nada mais pós-moderno e errado.

Existe dois Brasis? Um o Brasil real e o outro imaginário?

O Brasil real é aquele com o qual nos deparamos todos os dias de manhã, primeiramente a partir de nós mesmos, depois a partir dos nossos familiares, nossos colegas de trabalho, do andar pelas ruas e ver as coisas com nossos próprios olhos, de ouvir as opiniões dos outros nas esquinas, botecos, igrejas, praças, ônibus e hospitais lotados, ou até em restaurantes da moda. Esse é o Brasil mais real com o qual podemos ter contato?

A nossa realidade mais real possível, a do dia a dia, a de nossos relacionamentos pessoais mais diretos que seria a princípio a mais fácil de desvendar já se demonstra de dificílima percepção dada a complicada trama de imposições culturais, sociais, todos esses arquétipos e mitos fundadores que carregamos conosco desde sempre.

Ideias do tipo: Tudo é culpa dos portugueses ou que somos o país do futuro (que nunca se realiza), ou que somos gigantes pela própria natureza ou ainda, no espírito da autoajuda, que todos somos campeões e que precisamos somente de igualdade de oportunidade deixando que o resto, a meritocracia resolve. Esse é o primeiro matrix ao qual somos submetidos.

Depois vem um outro Brasil. Esse é a ponte de transição entre o Brasil real e o imaginário. É o Brasil dos noticiários. Venham de onde vierem desde O Globo ao Diário do Centro do Mundo.

Esse Brasil pretende ser real a partir de uma ideia? Contradição em termos porque se se pretende algo a partir de uma ideia é essencialmente ideal e não real? Eu sei que essa discussão dá pano para manga, mas, o que quero demonstrar aqui é que como sempre a briga é pelas consciências e não pela realidade. Por isso, tudo que acontece tem muito pouca chance de ter um rebate efetivo na vida real já que tudo é filtrado.

Pois bem, se nossa realidade mais real possível – a do dia a dia – se torna tão impossível de se perceber com clareza, nesse segundo matrix – o mundo dos noticiários – as coisas realmente se complicam, pois é um ambiente onde, a título de nos informarmos e nos inteirarmos com o que está acontecendo, nos deparamos de fato com um buffet variado onde temos muito pouca capacidade de determinar o que é real ou o que não é, simplesmente porque não temos acesso às fontes das informações, o que nos leva a ter que consumir o que está escrito ou veiculado de acordo com quem escreveu e sua agenda. Simplesmente nos submetem queiramos ou não.

Claro que existem aqueles cujos objetivos de alcançar e cooptar consciências são claros. Para esses é apenas parte do trabalho. Esses são muito menos ideólogos e mais pragmáticos. São até menos perigosos.

Quanta desconexão com a realidade!

O desenvolvimento da democracia implica em desenvolvimento progressivo de clareza e transparência do que nos é veiculado a título de notícia.

Fala-se demais de instituições no Brasil nos últimos dias. Essas instituições – esse tal Estado – está fadado ao desaparecimento – os maiores teóricos do Estado e da ciência política já chegaram a essa conclusão – Não vai ser hoje, não vai ser amanhã, mas essa estrutura passará.

Então, estamos nos debatendo contra gigantes moribundos, tentamos reformar o irreformável – o sistema do futuro é outro, não é esse que está aí – Partidos, Câmaras, Ministérios, Supremos, ONUs, Conselhos, FMIs – nada disso que está aí tem capacidade de dar respostas às novas demandas das pessoas.

São todas instituições representantes de uma época que já passou – são modernos, no sentido ruim da palavra, pois emanam um positivismo que tentou trazer ao mundo uma ordem e um progresso que nos levou a nada além que duas guerras mundiais, bombas atômicas, corridas armamentistas, uma guerra fria e uma pobreza mundial sem precedentes, ou seja, um mundo infeliz que dá inveja do universo orwelliano.

Esse modelo simplesmente não funciona mais em lugar nenhum do mundo. Vive de espasmos e solavancos sendo ameaçados por monstrengos tenebrosos como o Exército Islâmico, que por incrível que pareça é terrível e incrivelmente pós-moderno em todas suas abordagens tendo conseguido ler os sinais dos seus tempos com uma competência de dar medo: um território fluido, instituições medievais repaginadas, ideologias e alternativas para um bando de pessoas sem direção por meio do uso magistral dos instrumentos de mídia, redes sociais e alta tecnologia a serviço de seu programa.

Enquanto isso, nossas instituições não conseguem mais dar resposta além da política de bate estaca. Eu tampouco tenho respostas para como sair dessa encalacrada. A única coisa que posso dizer é que nosso mundo ainda é esse. É nele que vivemos. Enquanto não se puder fugir desse planeta (o que definitivamente será para poucos) precisaremos lidar com isso. Não me sinto pessimista, acho que as respostas vão começar a aparecer.

No caso do Brasil o que se faz necessário é, ao contrário do que os dinossauros da mídia estabelecida têm tentado fazer sutilmente, fomentar o debate, sobretudo nas redes sociais que é a melhor arena que temos no momento, apesar de todas as distorções. Normal. Não estamos acostumados nem a pensar, quanto mais a debater nossas ideias.

Somente a partir desses embates entre ideias as mais estapafúrdias que sejam é que aprenderemos a pensar e encontrar soluções coletivas.

Nesse debate pode surgir uma nova componente de forças que supere esse sistema partidário ridículo que se entranhou no sistema político brasileiro.

Não se enganem, é dessa arena que vão surgir as alternativas. Aqui o papel das pessoas mais sensatas e inteligentes nesse processo, de parte a parte é começar a se manifestar, de acordo com suas consciências, é claro, e tentar começar a dar direção aos processos caóticos que são parte desses ambientes, simplesmente porque é assim que eles são (privar esse caráter caótico e complexo do debate nas redes seria um erro). Só assim seria possível começar a tentar elevar o debate. Nós avançamos aos solavancos.

A elevação do debate é fundamental. Estamos na fase dos gritos e de opiniões apaixonadas. Logo teremos que começar a fundamentar essas opiniões até mesmo para confirmá-las ou abandoná-las em busca opiniões e respostas melhores.

A reforma política só acontece se for por essa via. Ela nunca acontecerá de maneira endógena nem a partir do paradigma que pariu o próprio sistema.

A alternativa a isso é continuar reféns de Dilmas, Lulas, Temers, Cunhas, Bolsonaros, Willys, Tiriricas e suas sopinhas de letras, PTs, PMDBs, PSDBs, PPPPPs, PRZTBs, PQPs ou pior, sermos invadidos pelos Mo(u)ros.

Crédito imagem: https://www.ifpb.edu.br/

(Em 19-04-16)

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