O Alfarrabista

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A votação do Impeachment: por Deus, pela Pátria e pela Família! – Parte 1 (em 24/04/16).

602987-970x600-1A votação do processo de impeachment da presidente Dilma no congresso Nacional no último domingo dia 18/04/16 foi inegavelmente um momento histórico interessantíssimo, sobretudo quando tiramos o foco do processo mais global, ou seja, a votação do processo de impeachment e o próprio processo de impeachment em si mesmo e focamos no processo mais individual, a saber, o comportamento, os discursos e os votos dos deputados federais.

De forma trágica ou cômica eles fizeram história. Vejamos alguns pontos que chamaram a atenção nesse episódio:

Primeiro ponto que chama a atenção: A sessão foi no domingo. Sim, é verdade! Os deputados federais brasileiros trabalharam no domingo. Isso por si só é grave, digno de nota e histórico. Alguma coisa muito importante, sem dúvida, precisa estar em jogo para que isso pudesse acontecer.

Em segundo lugar, pelo comportamento dos deputados federais durante a votação e por suas declarações durante os votos pudemos chegar a algumas conclusões acerca desses homens que são nossos representantes, que compõem a “casa do povo”. Vejamos:

1 – Pudemos perceber que o nível dos deputados é muito baixo, seja intelectual, seja emocional e sobretudo político. Logo o nível do debate e dos discursos foi muito baixo e demonstra a clara falência do nosso sistema de representação política – podemos dizer do sistema político em si.

2 – Por que podemos falar em falência do sistema político de representação brasileiro?

O Congresso Nacional como casa de leis e de representação do povo, na medida em que são eleitos pelo voto popular dentro de um sistema político que se estrutura em partidos políticos.

Mas o que vimos acontecer na votação de 18/04/16?

Vimos deputados votando em sua maioria de maneira independente e individual, agrupados por inércia em um bloco (ao estilo dos de carnaval) que tinha somente um ponto em comum: A farra! Ou seja, o impeachment da presidente a despeito de qualquer análise mais profunda do ponto de vista legal – como pôde ser visto durante os trabalhos da comissão parlamentar – e do consequente relatório apresentado para votação em plenário.

A maioria dos deputados desprezaram completamente as diretrizes programáticas dos seus próprios partidos. Isso demonstra tão somente que os nossos deputados federais agiram motivados por interesses próprios, de acordo com suas agendas particulares.

Deputados votando ao sabor de seus próprios interesses seria o mesmo que dizer que o sistema de representação política do país está ao sabor do vento.

Faço aqui um parêntese:

Realmente o governo Dilma é patético. Acho que, em primeiro lugar, Dilma não tem/não tinha a mínima condição de ser/ter sido presidente.

Acho que ela tinha que ter renunciado quando percebeu que não tinha a mínima condição de governar. Mas enfim, essa é uma outra questão. Ela não renunciou. Ela não reagiu. Ela não promoveu a união nacional e está sendo vítima de si mesma.

Mas, tudo isso não é motivo para contorcionismo constitucional, acusar a presidente em somente dois pontos: as famigeradas pedalas fiscais e o plano safra e na realidade julgá-la por todo seu governo – o que se convencionou chamar “o conjunto da obra”. Isso está errado.

Mesmo não sendo advogado, sei claramente que o processo de impeachment é jurídico-político, mas sei que mesmo assim o processo e o seu julgamento não podem correr sem limites e devem se ater às denúncias e à constituição federal.

Tudo isso não justifica o comportamento que vimos durante a comissão parlamentar e durante a votação no plenário. Ali os deputados federais, nossos representantes, são julgadores e julgadores precisam ser sérios e isentos.

Findo parêntese, voltemos ao tema:

3 – A título de conclusão preliminar vemos um Congresso composto de indivíduos que dão primazia a suas agendas individuais demonstra a total fraqueza do sistema partidário brasileiro. Sabendo que todo nosso sistema político está baseado no sistema partidário, logo, nosso sistema político está totalmente fraco, esgotado e superado.

Entendendo que os partidos, por definição, são grupos políticos, com uma identidade ideológica e social que se manifesta por meio de programas e posicionamentos definidos diante das questões nacionais que os insere no debate e no espectro político no Brasil o que os garante via eleições representatividade política.

Logo, se o sistema partidário está enfraquecido e corrompido, o sistema ideológico, programático e político desses partidos, que compõem o sistema de representação política no Congresso Nacional também está enfraquecido e corrompido enquanto instituição não alcançando os seus objetivos-fins: ser por excelência a casa onde se desenvolve a política e onde se legisla.

Assim, se estabelece uma espécie de círculo vicioso no qual a fraqueza do sistema político e do Congresso alimenta o personalismo que por sua vez acentua a fraqueza do sistema político e do Congresso.

A fraqueza institucional e o personalismo acentuam ou facilitam o crescimento da corrupção servindo desse modo o Congresso como polo generalizador da mesma.

4 – A título de um diagnóstico preliminar vemos que sistema legislativo brasileiro – estamos falando especificamente do Congresso Nacional, mas podemos aplicar a todas as instituições legislativas estaduais e municipais – está entravado. Não pode propor soluções para os impasses que ele mesmo criou.

A instituição estando a serviço de interesses pessoais não consegue cumprir o seu papel. Ela não funciona.

5 – As declarações dos deputados durante a votação e notadamente os votos proferidos demonstraram um nível intelectual baixíssimo, onde os então representantes do povo mal têm condição de comunicar com clareza seus pensamentos. Não quero nem mencionar a mutilação do vernáculo. Não sabem minimamente comunicar seus pensamentos e ainda assim são os nossos legisladores.

6 – As declarações dos deputados demonstram um nível emocional baixíssimo.

Os representantes do povo mal têm condições de controlar suas paixões e emoções. Comportaram-se como torcedores em uma partida de futebol (o que não seria um problema desde que estivessem em um estádio assistindo a uma partida de futebol e torcendo para o seu time do coração).

Os representantes do povo votaram com o fígado. Juízes não podem julgar com o fígado. Precisam julgar com o cérebro.

Mas não era esse o caso. Estavam no Congresso Nacional da República e nossos representantes contra qualquer princípio da boa educação (nem me atrevo a mencionar a palavra decoro) como tresloucados gritavam, urravam, xingavam, ofendiam, distribuíam cusparadas, torciam e vibravam a cada voto favorável ou contrário à sua facção.

Descontrole, despreparo e desconexão total com a realidade. Basta ver as expressões usadas nos votos. Coisas do tipo: “Pela BR-429”, “Pela minha mãe Lucimar”, “Pelo aniversário da minha neta”, “Pela minha tia Eurides, que cuidou de mim quando eu era pequeno”, “pelos militares de 64” e para fechar com chave de ouro “Por Campo Grande, a morena mais linda do Brasil”.

7 – As declarações dos deputados demonstram um nível de maturidade política baixíssimo. Isso os torna muito mais manipuláveis do que manipuladores. Não houve declarações programáticas. As expressões mais usadas foram: Deus, Pátria e Família.

Seguiremos falando desse assunto no post seguinte tentando aprofundar alguns pontos pertinentes para o entendimento do episódio sobretudo o que está por trás do uso desses três termos: DEUS, PÁTRIA e FAMÍLIA.

(Foto: Crédito: Folha-Uol)

(Em 24/04/16)

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