E se fosse uma jogada de mestre? (em 27/06/2017).
Um sistema não se explode, um sistema se implode. Creio que com essa afirmação eu possa criar antagonismos por pretender, com ela, acabar com todos os sonhos de “Revolução” tal como muitos a entendem.
Pois bem, dizer que a situação política brasileira ficou chata pode ser um exagero ou egoísmo (a raiz de todas as coisas!). Na verdade ela ficou e fica cada vez mais pandoricamente perigosa e explosiva.
O perigo não está nas obviedades tais como a corrupção sistêmica tupiniquim (total, geral e irrestrita), o golpe sofrido por Dilma, presidente legitimamente eleita, um partido “dos trabalhadores” ter colocado a banda podre do PMDB, Temer e sua camarilha na linha de sucessão do país, a economia em frangalhos, fruto de uma política econômica desastrosa ao estilo jabuticaba e o desinteresse repentino e geral da “massa” que apoiou a deposição de Dilma, na continuidade da novela, ou seja, na exposição dos crimes e denúncias daqueles que então capitaneavam a oposição e o processo de queda e “sucessão”.
Estariam cansados de gastar os seus preciosos domingos à tarde de camisas amarelas nas ruas?
Sem falar, em contraposição, no interesse geral em tudo e por tudo da comunidade internacional no que tem acontecido por aqui, que ameaça sobremaneira a nossa soberania.
Eis que diante de tudo isso, de repente, me peguei divagando e me perguntei: Se Dilma, sem nenhuma denúncia, com acusações frágeis, caiu praticamente sem resistir desde o início do processo, o que me incomodou muito, mesmo não sendo seu partidário, vejamos por outro lado o comportamento da TT (Turma do Temer), políticos profissionais. O cinismo, o poder de reação e de negação da realidade, ou como está na moda ultimamente, na tentativa de imposição de “verdades alternativas” é impressionante.
Assim, estando a maioria dos brasileiros tomando doses diárias de anestésicos ministrados pela Rede Globo, o que os deixam sem capacidade de discernir o tamanho do abacaxi, outros se intoxicam diariamente pelas redes sociais em suas tribos e enclaves que só serve para o aprimoramento das infâmias e violências de parte a parte.
Então, a maioria de nós ou se nega a se envolver, ou se envolve nessa polarização, nesse sectarismo que se espalha e que, sem dúvida, vai ser o maior subproduto, a verdadeira praga, conseqüente desse processo de ruína do sistema político brasileiro, da qual não nos livraremos por décadas e que tem o potencial real de acabar em sangue nas calçadas.
Alguns outros, que conseguem vislumbrar algum raio de luz fora do Matrix, não podem não ficar nada além de envergonhadamente perplexos.
Volto à minha divagação. Volto à Dilma. Não votei nela. Jamais votaria nela. Direito meu. Entretanto, não a denegri, não a acusei, não a difamei. Defendi o término do seu mandato. Nada mais que minha obrigação. Para mim, o governo dela foi um desastre sim! Por quais motivos? Tenho minha opinião esboçada, mas deixo a palavra final pra os analistas e para os historiadores (o tempo esclarecerá). A sua capacidade política estava muito aquém do Brasil, que como sabemos, não é para amadores.
Contudo, isso não muda o fato de que ela foi derrubada em um processo político-jurídico totalmente canhestro. Dilma, por mais incompetente que possa ter sido, tinha garantido pela Constituição Federal e pelo voto popular, o direito de governar até 2018. Mas, o fato é que Dilma caiu.
Temer, o pequeno, o vice decorativo, assumiu. Não esqueçamos que ele estava na chapa presidencial, elaborada em comum acordo com o PT tendo sido eleito com Dilma, e ela com ele.
Assim que toma assento no Planalto, Temer pôs em marcha a agenda que o levou até o cargo. Aquela agenda de homens brancos e velhos (nada contra a terceira idade, tudo contra o atraso!).
Vampiresco não só na aparência, mas também nos atos, nada mais lógico, que seu des-governo fosse a crônica de uma morte anunciada, da morte de quem sempre morreu e continuará morrendo em filas e tiroteios, o povo, o povo besta que os elegeu. Mas a vítima não será somente o povo. Ele será vítima de si mesmo. Afinal glória e ruína andam lado a lado ao sabor da Fortuna e da Virtù, que ao que parece faltam a ele.
Temer cairá, manobre o quanto manobrar, simplesmente porque não conseguirá entregar o que se comprometeu. Sua agenda não vai prosperar. Simplesmente porque não se pode esperar nada dele, é limitado e turvo, em suma, somos o que somos e mentirosos mentem, ladrões roubam e por aí vai.
Acho que ele se satisfez ao sentar na cadeira de Dilma, a turrona, pois como disse em sua “carta” para Dilma (isso mesmo, o tipo ainda está na era das cartas, o que talvez explique a sua confusão entre os russos de hoje com os soviéticos da década de 1980) o coitado, se sentia como um criado mudo, um objeto decorativo. Não era ouvido, não era prestigiado.
Verdade seja dita. Dilma não foi apoiada nem pelos seus. O PT a abandonou à própria sorte. O apoio final e derradeiro só foi dado a ela quando perceberam que o problema era tão grande que Lula e o próprio PT seriam tragados com ela. O apoio foi, portanto, muito mais para blindar Lula do que para salvar o mandato de Dilma.
Dilma foi massacrada pela oposição. Cumpriram o que prometeram no dia seguinte à sua reeleição. Fizeram com que sangrasse. E Dilma sangrou. Sangrou como “boa” guerrilheira, sangrou quieta. Estranhamente quieta. Fiquei até com pena diante do seu abandono, diante do seu auto-abandono. Cheguei ver ali aquele romantismo revolucionário da década de 1960-70 em sua atitude, bem à La Che, à La Allende e em alguns momentos enxerguei ali algum tipo de messianismo. Dilma na mão dos seus algozes, rumo ao abatedouro, sem reclamar, sem espernear.
Mas hoje, me ocorreu uma idéia interessante. Uma idéia diferente. Subestimar as pessoas é sempre muito fácil, não é? Nós, seres humanos, somos peritos nessa arte.
E se de repente, não mais que de repente, Dilma isolada, sem apoio, sem governabilidade, (afinal, como já sabemos, o sistema é f… parceiros), apanhando por todos os lados, em uma jogada de mestre tivesse deixado as coisas, por inércia, tomarem o rumo que tomaram e que, por conhecer os atores da trama, os seus detratores, ao deixar o sistema funcionar, deixando as coisas acontecerem como aconteceram, estivesse deixando uma bomba de efeito retardado, para precipitar a implosão do sistema, contra o qual ela não tinha a mínima chance?
Teria sido uma jogada de mestre? Teria sido uma jogada ao estilo varguista, que é o tipo de sangue que ao que parece corre em suas veias?
Seria uma atitude como a de Ratzinger (Bento XVI), que ao não poder contra a cúria romana, renuncia ao papado em favor de Bergoglio (Francisco), que parte para o enfrentamento, não tendo nada a “Temer” nem a perder?
Infelizmente Temer não é Francisco, e se houve um movimento desse da parte de Dilma foi muito perigoso. Mas eu confesso que adoraria acreditar nessa hipótese. O sistema nunca esteve tão a ponto de ruir!
Encerro melancolicamente com a frase mais dita e ouvida diante de todas as aberrações que estamos presenciando: Já está tudo precificado pelo mercado.
(Em 27/06/2017)